sábado, 2 de fevereiro de 2008

Curto Pavio III (continuação)



Com tal causa no leme da conjuntura, num ápice, por vingança e preconceito, Portugal assistiu a fenómenos de escárnio e maldizer que se tornaram estruturantes da cultura do Perjúrio: a ponte sobre o Tejo muda de nome; por rotina, as ruas, praças, largos e avenidas adoptam novas designações (cujos baptismos nalguns casos ofendem a memória dos Nossos Maiores); as estátuas caiem como tordos; o príncipe derrubado (Marcello Caetano) é exemplarmente punido (doze anos de prisão por ter cometido o crime de servir e governar Portugal[1]); a descolonização (que tanta dor, sofrimento e morte causou) foi feita debaixo dum exemplar silêncio e estrategicamente continua (exemplarmente) silenciada; a liberdade deixou de ser um valor credível para se transformar numa falácia; institucionalizou-se o cultismo do dizer democrático e do fazer o seu contrário; falsificou-se a democracia e com ela falsificaram-se os seus ingénitos compadres (a liberdade e a autoridade) e como consequência o soberano (por um dia), espera 19 anos por uma decisão do tribunal; vê cinco comissões de inquérito concluírem que Camarate foi crime e ponto final parágrafo; vê os deputados defraudarem conscientemente o erário público sem censura (judicial ou política); presume que a indulgência às FP-25 é o pagamento de uma dívida de gratidão; vê o príncipe render-se e sucumbir aos instintos da perversão: se não pode com a droga, legaliza-a, se não pode com o aborto, legaliza-o, se não pode com a tourada de morte, legaliza-a, etc. (sabemos o que nos espera quando não puder com o roubo!); vê os lobbies da alegada liberdade sexual conquistarem cada vez mais território (gayismo, lesbianismo, travestismo, transformismo, etc.); vê o processo dos hemofílicos ficar em águas de bacalhau; assiste ao regabofe do caso da pedofilia; vê a imparcial e insuspeita sabedoria judicial descobrir que, no caso fax de Macau, houve corrupção, houve corruptor mas não foi capaz de encontrar e punir o corrompido; vê ser eleito (nas suas costas) indivíduos com um passado pecaminoso e um cadastro de preconceito e vingança; vê o príncipe brincar ao referendo com coisas banais e enquanto isso, nas suas, costas decide assuntos vitais (soberania) que apenas à Nação (e nunca à Representação) dizem respeito; vê o seu filho ir para a escola e regressar sem relógio, anel, dinheiro ou qualquer valor; vê a mulher ser assediada ou violada (embora lhe seja garantido a liberdade para se queixar de ninguém); sente-se inseguro; julga-se enganado; não confia em ninguém; vê o respeito escoar-se pelo autoclismo da libertinagem; vê o Príncipe exceder-se em regalias enquanto compatriotas (e ainda por cima soberanos) vivem debaixo duma ponte; vê a autoridade a ser confundida com o autoritarismo; vê o permissivo triunfar sobre o coercivo; sente a anarquia, a corrupção e a irresponsabilidade a todos os níveis da administração; sente-se enganado quando lhe dizem que pertence ao pelotão dos ricos e no entanto só vê miséria; vê semanalmente um comboio colidir com um veículo automóvel (isto num país dito do pelotão da frente); vê e sente que o civismo foi atirado para a sarjeta do oportunismo; vê um licenciado (após cinco anos de dedicação, esforço e sacrifício) não ter emprego e enquanto isso os “Zé Marias”, em apenas quatro meses, co-leccionando a maledicência, o despudor e a recalcitrância, asseguram as suas reformas; descobre que o critério da distinção pública tem uma correlação com altos serviços prestados à Pátria menos nítida do que o corporativismo, o lobbie, a filiação partidária e a maçonaria (casos houve de distinção pública de cidadãos que foram responsáveis e culpados de actos que configuram o crime de delinquência de alta traição); vê o trabalho infantil ser objecto dum jocoso racismo social (se uma criança de 13 anos, pertencente a um família humilde, cuja mãe é doente crónica e o pai um crónico alcoólico, ambos desempregados, é apanhada a trabalhar o Estado vê aqui o crime de abuso de trabalho infantil, mas fecha os olhos se por outro lado essa criança for descendente duma família VIP que por ter sido bafejada com um corpo atraente e uma voz fonética já pode exercer a profissão de manequim, cantor, bailarina ou locutora de TV que, não apenas é excelentemente remunerada como ainda passa a ser notícia de primeira página e a ter direito a entrevistas); vê os mesmos que em tempos gritaram histericamente “nem mais um soldado para o Ultramar[2], hoje investidos em altos cargos, mais de circunstância que servidão, enviarem agora para a morte injustificada, longe do torrão natal, (Timor, Kosovo, Bósnia e outros lugares), compatriotas dizendo-lhes que são vedetas dos modernos sistemas de defesa e de segurança; vê aparecer, a pretexto da liberdade de imprensa, na primeira página do jornal ou na abertura do telejornal a fotografia do criminoso lado a lado com a fotografia do inocente; vê os culpados da queda da ponte de Entre-os-rios vazarem na maré da irresponsabilidade; assiste ao preciosismo dum tribunal que descobre como culpado para o assassínio duma criança, cuja negligência foi ter carregado (conforme mandam as regras) no botão sinalizador dum semáforo (em plena capital), um electricista há anos reformado; vê crianças serem “assassinadas”, em locais de diversão, devido à negligência grosseira do Estado, enquanto o Príncipe assobia e olha para o lado; vê milhares de concidadãos perecerem em acidentes de viação por causa de sinalizações deficientes, ou inexistentes, estradas maltratadas, bermas transformadas em lixeiras; vê o Príncipe, dito democrático, insinuar com triunfalismo que a democracia é património e exclusividade da esquerda, incluindo a esquerda xenófoba; vê um representante chamar, impunemente, cobarde ao primeiro-ministro de Portugal; vê os concidadãos que resolvem adquirir (a custo diga-se) a sua casa própria, ter de pagar duas (a dele e a do trapaceiro a quem o representante gratifica por não cumprir a lei, por fugir aos impostos e por adoptar uma opção de vida clandestina); vê o concidadão espoliado por ter de pagar, de forma compelida, a taxa duma TV que recusa ver porque os seus programas são intragáveis; vê o estado com os seus impostos dar gratuitamente seringas para sustento dum vício voluntariamente adquirido, enquanto compatriotas com problemas involuntários de saúde têm de pagar a seringa que a doença não dispensa; vê o Príncipe tratar a direita de xenófoba enquanto a esquerda (quiçá ainda mais xenófoba), é tratada com solenidade (e pasme-se elege representantes); vê o conceito de família a ser completamente destruído a soldo de instintos e tentações sexuais antinatura; vê o mesmo Estado que penaliza e persegue o consumo de álcool, incentivar paradoxalmente o consumo, patrocinando uma marca de cervejas nas camisolas das quinas (selecção nacional de futebol); vê enfim o cumpridor (cada vez mais minoritário), o respeitador e o zeloso – afinal um dos poucos que ainda “pede desculpa” quando falha e utiliza o termo “por favor” quando se dirige aos outros - a ser vilipendiado e sentenciado por cumprir a norma, por obedecer aos valores, por sujeitar-se à lei; vê um célebre advogado dizer em plena TV, em horário nobre, que hoje “paga-se mais caro para se ser livre que no tempo da ditadura” sem que ninguém o conteste (talvez por ser verdade!); vê três distintos generais dizerem em plena TV que as forças armadas “bateram no fundo”; vê um dos mais ínclitos (ir)responsáveis pelos acordos de descolonização dizer, 25 anos depois, que sobre tais acordos “se limitou” a corrigir a ortografia[3]; vê a TV noticiar e seguir passo a passo a recuperação dum golfinho, enquanto milhares de portugueses vegetam nos corredores dos hospitais ou nas listas de espera; vê os patriotas do narcisismo inspirarem, em vida (com dinheiro público), fundações utilizando o seu próprio nome; vê o soberano abstémio (consciente) ser considerado de inimigo abjecto que necessita de ser combatido, enquanto os representantes se abstêm do seu dever faltando sistematicamente (chegando-se ao cúmulo de votações não serem homologadas por falta de quórum!); vê o príncipe propor-lhe referendos para fraccionar o País, enquanto o ignora no processo de transferência da soberania para Bruxelas; vê-se vinculado a uma constituição que não referendou; vê o lobbie do futebol, em concluio com o da construção civil, impor a construção de 10 estádios de futebol para serem usados durante 3 semanas; vê o representante obter com dois mandatos ou pouco mais do que isso (consumidos como atrás dissemos no sopé da “abstenção”) a reforma vitalícia enquanto o soberano só a ela tem direito (democraticamente) aos 65 anos, isto se entretanto não tiver perecido; vê o poderoso safar-se por sistema enquanto o Zé Ninguém (soberano e inocente) se entala sistematicamente; vê o sortudo da fortuna ou o herdeiro do oportunismo curar-se numa clínica particular (dos E.U.A ou Inglaterra) enquanto o soberano vegeta canceroso num corredor, sem luz do dia, dum hospital público; vê o requerente ficar sem resposta enquanto o arruaceiro, o trapaceiro ou “sindicalista” é logo ouvido e atendido; assiste estupefacto à circunstância duma obra pública (prolongamento do metropolitano até Amadora) ser inaugurada debaixo duma manifestação e, este facto, ter sido a verdadeira e relevante notícia; vê, a pretexto da liberdade de imprensa, a TV noticiar que a PSP interrompeu uma corrida de automóveis tão clandestina como perigosa, sendo o relevo dado ao facto da Polícia não confirmar as agressões feitas aos recalcitrantes, invertendo as prioridades; vê a esquerda política ficar horrorizada quando a polícia espanhola investe sobre intrusos (entre eles um representante xenófobo); vê o bastonário da ordem dos advogados dizer publicamente que a Justiça é uma “galeria de horrores” e, acrescentar que aos honestos não resta outra coisa senão “desistir dos seus legítimos direitos” pois a Justiça não está à altura de os garantir (coisa com que infelizmente concordamos, justamente com conhecimento de causa); vê os símbolos nacionais serem constantemente desrespeitados; vê o hino ser assobiado; vê a bandeira ser ultrajada, tratada como um trapo e servindo vezes de mais de toalha de mesa; ouve o Sr. Martin Keller dizer que em Portugal é fácil arranjar do pé para a mão um corrupto para deixar colocar uma bomba, sem que nenhum poder público reaja; vê o direito à greve ser utilizado como instrumento de pressão em nítido prejuízo do soberano; etc.

Enfim vê e assiste a tudo isso, enquanto lhe gritam que é livre e soberano, sem que ele coitado saiba sequer o significado de qualquer dos conceitos ofertados.


[1] Esta estranha condenação oferece-nos uma lição de vida: quem um dia julgará e condenará os crimes cometidos pelo príncipe actual?

[2] Quando estes soldados então defendiam legitimamente o património constitucional!?

[3] Quando Portugal devia ter sido uma das partes do acordo e por isso tinha o dever e o direito de ter mexido e participado nos conteúdos!?

4 comentários:

fotógrafa disse...

Pois é...este é o País dos "alheados"!!!
malabaristas e acrobatas, caminhamos todos na corda bamba...
será que sem a rede,conseguiremos sobreviver???
resposta para a pergunta, acho que não temos.
Abraço

fotógrafa disse...

Ora viva Major...cá vou passando,para desejar bom fds...
esperando por mais leitura, que é sempre agradável de ler e entender...
Abraço

fotógrafa disse...

Bom dia Major, de certeza que o seu amigo lhe dá as indicações todas...é muito fácil.
Eu que sou uma leiga nestes assuntos consigo...de certeza que também vai conseguir fazer isso e linkar outros blogues que goste.Cá estou á espera de novos posts seus,que leio sempre com enorme curiosidade e gosto.
Um abraço e desejo de boa semana de trabalho...e não só...rsrsrs

fotógrafa disse...

EUREKA!!!PARABÉNS!!!então tá a ver?sempre conseguiu....
Abraço